Tenor em ascensão
Após seis anos na Europa, tenor mineiro Matheus Pompeu volta ao Brasil para cantar em La traviata, no Rio de Janeiro
Por Amanda Queirós para a REVISTA CONCERTO
NOV 2023
Uma carreira na música não era exatamente o que Matheus Pompeu buscava enquanto crescia na cidade mineira de Três Corações, sua terra natal. Levou um tempo – e alguns encontros providenciais – para ele se dar conta da própria vocação para o canto lírico
Deixou, então, a voz guiá-lo pelo mundo. E é ela a responsável pelo retorno do tenor de 35 anos ao Brasil, neste mês, para encarnar Alfredo Germont na nova montagem de La traviata, ópera de Verdi, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, encerrando a temporada lírica da casa. Com direção cênica de André Heller-Lopes e direção musical e regência de Luiz Fernando Malheiro, esta será a primeira interpretação de fôlego de Pompeu no país desde sua ida em definitivo à Europa, em 2017. E a obra não poderia ser melhor.
“Minha trajetória é muito direcionada ao repertório de Verdi, meu compositor favorito. Para Alfredo, busco construir um som belcantista, baseado na elegância, na pureza e no frescor da voz, até porque ele é um sonhador e vive a euforia da juventude”, explica o tenor, referindo-se ao personagem e seu intenso envolvimento com a cortesã Violetta no libreto inspirado no romance A dama das camélias, de Alexandre Dumas (1802-70).
O apreço de hoje ao canto lírico se contrapõe à inclinação inicial de Pompeu. Na infância, seu interesse pela música passava pelo piano, reflexo da presença do instrumento herdado pelo avô na sala de casa. Na adolescência, começou a soltar a voz na igreja. “Sentia que o pessoal se empolgava mais quando eu cantava que quando tocava piano”, lembra. Por isso, buscou uma escola de canto popular, na qual a proprietária, porém, foi taxativa: seu lugar não era ali, e sim na ópera.
Outra pessoa a reconhecer a aptidão foi Mauro Chantal, professor de música da Universidade Federal de Minas Gerais, que insistiu no ingresso do rapaz no curso. Ao se mudar para Belo Horizonte a fim de seguir os estudos no ensino superior, optou por graduações simultâneas em jornalismo e música. Com tantos indicativos favoráveis, enfim trocou o piano pelo canto lírico.
Após a formatura, em 2011, migrou para São Paulo, onde estudou com Isabel Maresca e participou de algumas produções de pequeno porte – trabalho intensificado no Ópera Studio do Theatro Municipal, na época sob a direção do maestro John Neschling. Foi um período de master classes com nomes consagrados, como os tenores Gregory Kunde, Marcello Giordani (1963-2019) e a mezzo soprano Marianne Cornetti, além de algumas premiações, como o primeiro lugar no Concurso Carlos Gomes e dois troféus no V Concorso Internazionale Marcello Giordani, na Itália.
Com essas experiências no currículo, veio o passo seguinte. Por indicação do amigo e pianista Rafael Andrade (1981-2020), conheceu o programa de formação em ópera do Palau de les Arts, de Valência, na Espanha, dirigido naquele momento por Davide Livermore e Plácido Domingo. Rumou para lá. A mudança consolidou Pompeu como profissional. “Aqui pude conhecer realmente o funcionamento de um grande teatro, e o mais importante disso foi ter conhecido Fabio Biondi”, diz. O violinista e maestro italiano se preparava para gravar um álbum com seu grupo, o Europa Galante, e o tenor Roberto Alagna, mas o francês cancelou a participação às vésperas da entrada em estúdio. Pompeu estava no lugar certo e na hora certa. Lançado em 2018, Halka foi indicada ao International Opera Award 2020 como melhor gravação de ópera completa. Em destaque, estava o mineiro no principal papel masculino da obra criada pelo polonês Stanisław Moniuszko (1819-72).
A partir daí viriam outros três discos com o grupo de Biondi e uma agenda de apresentações conjuntas, além do primeiro prêmio na IV Competição Internacional Adam Didur, em 2019. “Fui a lugares muito importantes com Fabio. Ele é um grande músico e me inspira muito.”
Após um intervalo de projetos por causa da pandemia de covid-19, o tenor cantou em Stabat Mater, de Dvorák, Ernani, de Verdi e na gravação da ópera Paria, de Moniuszco. Esse ritmo o preparou para La traviata carioca e Madama Butterfly, de Puccini, agendada para junho de 2024 com a Filarmônica de Minas Gerais.
Entre as duas temporadas, um novo desafio verdiano: estrelar Un ballo in maschera na Polônia. “Essa foi a primeira ópera que cantei, ainda em Belo Horizonte, em uma participação pequena. E agora farei Gustavo, o papel da vida de Luciano Pavarotti. É um personagem icônico para o tenor lírico, e vai ser muito especial fazê-lo.”